O TEMPO DENTRO DO ESPELHO
O tempo não existe,
meu amor.
O tempo é nada mais que uma invenção
de quem tem medo de ficar eterno.
De quem não sabe que nada se acaba,
que tudo o que se vive permanece
cinza de amor ardendo na memória.
O tempo passa? Ai, quem me dera! O tempo
fica dentro de mim, cantando fica
ou me queimando, mas sou eu quem canto
eu que me queimo, o tempo nada faz
sem mim que lhe permito a minha vida.
De mim depende, sou sua matéria,
esterco e flor do chão da minha mente,
o tempo é o meu pecado original.
Para cumprir-se, o tempo necessita
de tudo o que já fiz e se aproveita
da moça adormecida na campina
perante a minha dor adolescente;
dos cabelos da minha mãe tão moça,
tão valente na proa da canoa;
da lágrima no olhar do meu amigo
me dizendo "que pena, eu vou morrer";
do meu primeiro filho perguntando
"para onde vai o mar quando é de noite?",
da tua mão na minha dentro da água;
do medo que eu senti na cordilheira,
dos cavalos correndo no vulcão
assustando as estátuas solitárias
com seus olhos de pedra me espreitando;
da pele do meu peito que murchou;
do espelho sempre intacto em que se esconde
o pretérito mais do que imperfeito
da minha vida.
O tempo é a minha sina
aderida a meu sonho além da aurora,
a frágua do meu cântico futuro,
o tempo dentro do espelho.
O tempo é a sombra e a luz do pensamento.
Mas sobretudo é o que te faz pensar.
Por isso ele não passa e não se perde.
O tempo dura inteiro a teu dispor:
pele imóvel de mar em movimento,
feito de imagens, nuvens, flores, flamas
e cinzas — tudo coisas que te falam
na voz, que não se cala, dos silêncios.
O tempo é nada mais que uma invenção
de quem tem medo de ficar eterno.
De quem não sabe que nada se acaba,
que tudo o que se vive permanece
cinza de amor ardendo na memória.
O tempo passa? Ai, quem me dera! O tempo
fica dentro de mim, cantando fica
ou me queimando, mas sou eu quem canto
eu que me queimo, o tempo nada faz
sem mim que lhe permito a minha vida.
De mim depende, sou sua matéria,
esterco e flor do chão da minha mente,
o tempo é o meu pecado original.
Para cumprir-se, o tempo necessita
de tudo o que já fiz e se aproveita
da moça adormecida na campina
perante a minha dor adolescente;
dos cabelos da minha mãe tão moça,
tão valente na proa da canoa;
da lágrima no olhar do meu amigo
me dizendo "que pena, eu vou morrer";
do meu primeiro filho perguntando
"para onde vai o mar quando é de noite?",
da tua mão na minha dentro da água;
do medo que eu senti na cordilheira,
dos cavalos correndo no vulcão
assustando as estátuas solitárias
com seus olhos de pedra me espreitando;
da pele do meu peito que murchou;
do espelho sempre intacto em que se esconde
o pretérito mais do que imperfeito
da minha vida.
O tempo é a minha sina
aderida a meu sonho além da aurora,
a frágua do meu cântico futuro,
o tempo dentro do espelho.
O tempo é a sombra e a luz do pensamento.
Mas sobretudo é o que te faz pensar.
Por isso ele não passa e não se perde.
O tempo dura inteiro a teu dispor:
pele imóvel de mar em movimento,
feito de imagens, nuvens, flores, flamas
e cinzas — tudo coisas que te falam
na voz, que não se cala, dos silêncios.
Thiago de Mello, Num
Campo de margaridas, 1986.
EL TIEMPO DENTRO DEL
ESPEJO
El tiempo no existe, mi
amor.
El tiempo es sólo una
invención
de quien tiene miedo a
ser eterno.
De quien no sabe que
nada se acaba,
que todo lo que se vive
permanece
como rescoldo de amor
ardiendo en la memoria.
¿Pasa el tiempo?
¡Ojalá! El tiempo
permanece en mi
interior, permanece cantando
o quemándome, pero yo
soy quien canto
yo quien me quemo, el
tiempo no hace nada
sin mí que lo permito
en mi vida.
De mí depende, soy su
materia,
abono y flor de la
tierra de mi mente,
el
tiempo es mi pecado original.
Para cumplirse, el
tiempo necesita
de todo lo que hice y
se aprovecha
de la joven dormida en
el campo
ante mi dolor
adolescente;
de los cabellos de mi
madre tan joven,
tan valiente en la proa
de la canoa;
de la lágrima en la
mirada de mi amigo
diciéndome "que
pena, voy a morir";
de mi hijo mayor
preguntándome
"¿a dónde va el
mar cuando es de noche?",
de tu mano en la mía
dentro del agua;
del miedo que sentí en
la cordillera,
de los caballos
corriendo en el volcán
asustando a las
solitarias estatuas
que me acechaban con
sus ojos de piedra;
de la piel de mi pecho
que se marchitó;
del espejo siempre
intacto en que se esconde
el pretérito de lo más
que imperfecto
de mi vida.
El tiempo es mi sino
adherido a mi sueño
más allá de la aurora,
el tiempo dentro del
espejo.
El tiempo es la sombra
y la luz del pensamiento.
Pero sobre todo es lo
que te hace pensar.
Por eso no pasa y no se
pierde.
El tiempo permanece
entero a tu disposición:
piel inmóvil de mar en
movimiento,
hecho de imágenes,
nubes, flores, llamas
y cenizas — todas
las cosas que te hablan
en la voz, que no se
calla, de los silencios.
Thiago de Mello, En un campo de margaritas, 1986.
(Versión de Pedro Casas Serra)
Thiago de Mello, En un campo de margaritas, 1986.
(Versión de Pedro Casas Serra)
No hay comentarios:
Publicar un comentario