domingo, 31 de julio de 2016

“CÂNTICO 19 - NÃO TEM MAIS LAR” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 19 - NÃO TEM MAIS LAR

Não tem mais lar o que mora em tudo.
Não há mais dádivas
Para o que não tem mãos.
Não há mundos nem caminhos
Para o que é maior que os caminhos
E os mundos.
Não há mais nada além de ti,
Porque te dispersaste...
Circulas em todas as coisas
E todos te sentem
Sentem-te como a si mesmos
E não sabem falar de ti.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 19 - NO TIENE HOGAR

No tiene hogar lo que vive en todo.
No hay dádivas
Para lo que no tiene manos.
No hay mundos ni caminos
Para lo que es mayor que los caminos
Y los mundos.
No hay nada fuera de ti,
Porque te dispersaste...
Circulas en todas las cosas
Y todos te sienten
Sintiéndote como a sí mismos
Y no saben hablar de ti.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

sábado, 30 de julio de 2016

“CÂNTICO 18 - QUANDO OS HOMENS” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 18 - QUANDO OS HOMENS

Quando os homens na terra sofrerem
Sofrimento do corpo,
Sofrimento da alma,
Tu não sofrerás.
Quando os olhos chorarem
E as mãos e quebrarem de angústia
E a voz se acabar no rogo e na ameaça,
Quando os homens viverem,
Tu não viverás.
Quando os homens morrerem na vida,
Quando os homens nascerem na morte,
Na vida e na morte nunca mais
Nunca mais tu não morrerás.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 18 - CUANDO LOS HOMBRES

Cuando los hombres en la tierra sufran
Sufrimiento del cuerpo,
Sufrimiento del alma,
Tú no sufrirás.
Cuando los ojos lloren
Y las manos se retuerzan de angustia
Y la voz acabe en el ruego y en la amenaza,
Cuando los hombres vivan,
Tú no vivirás.
Cuando los hombres mueran en la vida,
Cuando los hombres nazcan en la muerte,
En la vida y en la muerte nunca más
Nunca más tú morirás.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

viernes, 29 de julio de 2016

“CÂNTICO 17 - PERGUNTARÃO PELA TUA ALMA” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 17 - PERGUNTARÃO PELA TUA ALMA

Perguntarão pela tua alma.
A alma que é ternura,
Bondade,
Tristeza,
Amor.
Mas tu mostrarás a curva do teu vôo
Livre, por entre os mundos...
E eles compreenderão que a alma pesa.
Que é um segundo corpo,
E mais amargo,
Porque não se pode mostrar,
Porque ninguém pode ver...

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 17 - PREGUNTARÁN POR TU ALMA

Preguntarán por tu alma.
El alma que es ternura,
Bondad,
Tristeza,
Amor.
Pero tú mostrarás la amplitud de tu vuelo
Libre, por entre los mundos...
Y ellos comprenderán que el alma pesa.
Que es un segundo cuerpo,
Y más amargo,
Porque no se puede mostrar,
Porque nadie lo puede ver...

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

jueves, 28 de julio de 2016

“CÂNTICO 16 - TU OUVIRÁS ESTA LINGUAGEM” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 16 - TU OUVIRÁS ESTA LINGUAGEM

Tu ouvirás esta linguagem,
Simples,
Serena, difícil.
Terás um encanto triste.
Como os que vão morrer,
Sabendo o dia...
Mas intimamente
Quererás esta morte,
Sentindo-a maior que a vida.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 16 - TU OIRÁS ESTE LENGUAJE

Tú oirás este lenguaje,
Simple,
Sereno, difícil.
Tendrás un encanto triste.
Como los que van a morir,
Sabiendo el día...
Pero íntimamente
Querrás esta muerte,
Sintiéndola más grande que la vida.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

miércoles, 27 de julio de 2016

“CÂNTICO 15 - NÃO QUEIRAS SER” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 15 - NÃO QUEIRAS SER

Não queiras ser.
Não ambiciones.
Não marques limites ao eu caminho.
A Eternidade é muito longe.
E dentro dele tu te moves, eterno.
Sê o que vem e o que vau.
Sem forma.
Sem termo.
Como uma grande luz difusa.
Filha de nenhum sol.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 15 - NO QUIERAS SER

No quieras ser.
No ambiciones.
No pongas límites a tu camino.
La Eternidad está muy lejos.
Y dentro de ella tú te mueves, eterno.
Se lo que viene y lo que va.
Sin forma.
Sin término.
Como una gran luz difusa.
Hija de ningún sol.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

martes, 26 de julio de 2016

“CÂNTICO 14 - ELES TE VIRÃO OFERECER O OURO” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 14 - ELES TE VIRÃO OFERECER O OURO

Eles te virão oferecer o ouro da Terra.
E tu dirás que não.
A beleza.
E tu dirás que não.
O amor.
E tu dirás que não, para sempre.
Eles te oferecerão o ouro d’além da Terra.
E tu dirás sempre o mesmo.
Porque tens o segredo de tudo.
E sabes que o único bem é o teu.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 14 - ELLOS TE OFRECERÁN EL ORO

Ellos te ofrecerán el oro de la Tierra.
Y tú dirás que no.
La belleza.
Y tú dirás que no.
El amor.
Y tú dirás que no, para siempre.
Ellos te ofrecerán el oro de más allá de la Tierra.
Y tú dirás siempre lo mismo.
Porque tienes el secreto de todo.
Y sabes que el único bien es el tuyo.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

lunes, 25 de julio de 2016

“CÂNTICO 13 - RENOVA-TE” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 13 - RENOVA-TE

Renova-te.
Renasce em ti mesmo.
Multiplica os teus olhos, para verem mais.
Multiplica os teus braços para semeares tudo.
Destrói os olhos que tiverem visto.
Cria outros, para as visões novas.
Destrói os braços que tiverem semeado,
Para se esquecerem de colher.
Sê sempre o mesmo.
Sempre outro.
Mas sempre alto.
Sempre longe.
E dentro de tudo.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 13 - RENUÉVATE

Renuévate.
Renace en ti mismo.
Multiplica tus ojos, para ver más.
Multiplica tus brazos para sembrarlo todo.
Destruye los ojos que hayan visto.
Crea otros, para las visiones nuevas.
Destruye los brazos que hayan sembrado,
Para olvidarse de cosechar.
Sé siempre el mismo.
Siempre otro.
Pero siempre alto.
Siempre lejos.
Y dentro de todo.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

domingo, 24 de julio de 2016

“CÂNTICO 12 - NÃO FALES AS PALAVRAS DOS HOMENS “ de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 12 - NÃO FALES AS PALAVRAS DOS HOMENS

Não fales as palavras dos homens.
Palavras com vida humana.
Que nascem, que crescem, que morrem.
Faze a tua palavra perfeita.
Dize somente coisas eternas.
Vive em todos os tempos
Pela tua voz.
Sê o que o ouvido nunca esquece.
Repete-te para sempre.
Em todos os corações.
Em todos os mundos.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 12 - NO PRONUNCIES LAS PALABRAS DE LOS HOMBRES

No pronuncies las palabras de los hombres.
Palabras con vida humana.
Que nacen, que crecen, que mueren.
Haz tu palabra perfecta.
Di solamente cosas eternas.
Vive en todos los tiempos
Por tu voz.
Sé lo que el oído nunca olvida.
Te repite para siempre.
En todos los corazones.
En todos los mundos.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

sábado, 23 de julio de 2016

“CÂNTICO 11 - VÊ, FORMARAM-SE TODAS AS ÁGUAS” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 11 - VÊ, FORMARAM-SE TODAS AS ÁGUAS

Vê, formaram-se todas as águas
Todas as nuvens.
Os ventos virão de todos os nortes.
Os dilúvios cairão sobre os mundos.
Tu não morrerás.
Não há nuvens que te escureçam.
Não há ventos que te desfaçam.
Não há águas que te afoguem.
Tu és a própria nuvem.
O próprio vento.
A própria chuva sem fim...

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 11 - VE, SE FORMARON TODAS LAS AGUAS

Ve, se formaron todas las aguas
Todas las nubes.
Los vientos vendrán de todos los nortes.
Los dilúvios caerán sobre los mundos.
Tú no morirás.
No hay nubes que te oscurezcan.
No hay vientos que te deshagan.
No hay aguas que te ahoguen.
Tú eres la propia nube.
El propio viento.
La propia lluvia sin fin...

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

viernes, 22 de julio de 2016

“CÂNTICO 10 - ESTE É O CAMINHO” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 10 - ESTE É O CAMINHO

Este é o caminho de todos que virão.
Para te louvarem.
Para não te verem.
Para te cobrirem de maldição.
Os teus braços são muito curtos.
E é larguíssimo este caminho.
Com eles não poderás impedir
Que passem, os que terão de passar,
Nem que fiques de pé,
Na mais alta montanha,
Com os teus braços em cruz.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 10 - ÉSTE ES EL CAMINO

Éste es el camino de todos los que vendrán.
Para halagarte.
Para ignorarte.
Para cubrirte de maldiciones.
Tus brazos son muy cortos.
Y es anchísimo este camino.
Con ellos no podrás impedir
Que pasen, los que pasarán,
Ni quedándote de pie,
En la más alta montaña,
Con tus brazos en cruz.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

jueves, 21 de julio de 2016

“CÂNTICO 09 - OS TEUS OUVIDOS” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 09 - OS TEUS OUVIDOS

Os teus ouvidos estão enganados.
E os teus olhos.
E as tuas mãos.
E a tua boca anda mentindo
Enganada pelos sentidos.
Faze silêncio no teu corpo.
E escuta-te.
Há uma verdade silenciosa dentro de ti.
A verdade sem palavras.
Que procuras inutilmente,
Há tanto tempo,
Pelo teu corpo, que enlouqueceu.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 09 - TUS OÍDOS

Tus oídos están equivocados.
Y tus ojos.
Y tus manos.
Y tu boca miente
Engañada por los sentidos.
Haz silencio en tu cuerpo.
Y escúchate.
Hay una verdad silenciosa dentro de ti.
La verdad sin palabras.
Que buscas inútilmente,
Hace tanto tiempo,
Por tu cuerpo, que enloqueció.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

miércoles, 20 de julio de 2016

“CÂNTICO 08 - NÃO DIGAS” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 08 - NÃO DIGAS

Não digas: “O mundo é belo”
Quando foi que viste o mundo?

Não digas: “O amor é triste”.
Que é que tu conheces do amor?

Não dias: “A vida é rápida”.
Como foi que mediste a vida?

Não digas: “Eu sofro”.
Que é que dentro de ti és tu?

Que foi que te ensinaram
Que era sofrer?

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 08 - NO DIGAS

No digas: “El mundo es bello”
¿Cuándo viste tú el mundo?

No digas: “El amor es triste”.
¿Qué conoces tú del amor?

No digas: “La vida es corta”.
¿Cómo mediste tú la vida?

No digas: “Yo sufro”.
¿Acaso estás dentro de ti?

¿Qué fue lo que te enseñaron
Que era sufrir?

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

martes, 19 de julio de 2016

“CÂNTICO 07 - NÃO AMES” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 07 - NÃO AMES

Não ames como os homens amam.
Não ames com amor.
Amor sem amor.
Ama sem querer.
Ama sem sentir.
Ama como se fosses outro.
Como se fosses amar.
Sem esperar.
Por não esperar.
Tão separado do que ama, em ti,
Que não te inquiete
Se o amor leva à felicidade,
Se leva à morte,
Se leva a algum destino.
Se te leva.
E se vai, ele mesmo...

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 07 - NO AMES

No ames como los hombres aman.
No ames con amor.
Amor sin amor.
Ama sin querer.
Ama sin sentir.
Ama como si fueses otro.
Como si fueses a amar.
Sin esperar.
Por no esperar.
Tan separado del que ama, en ti,
Que no te inquiete
Si el amor lleva a la felicidad,
Si lleva a la muerte,
Si lleva a algún destino.
Si te lleva.
Y se va, él mismo...

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

lunes, 18 de julio de 2016

“CÂNTICO 06 - TU TENS UM MEDO” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 06 - TU TENS UM MEDO

Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 06 - TÚ TIENES UN MIEDO

Tú tienes un miedo:
Acabar.
No ves que acabas cada día.
Que mueres en el amor.
En la tristeza.
En la duda.
En el deseo.
Que te renuevas cada día.
En el amor.
En la tristeza.
En la duda.
En el deseo.
Que eres siempre otro.
Que eres siempre el mismo.
Que morirás por edades inmensas.
Hasta no tener miedo de morir.
Y entonces serás eterno.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

domingo, 17 de julio de 2016

“CÂNTICO 05 - ESSE TEU CORPO” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 05 - ESSE TEU CORPO

Esse teu corpo é um fardo.
È uma grande montanha abafando-te.
Não te deixando sentir o vento livre
Do Infinito.
Quebra o teu corpo em cavernas
Para dentro de ti rugir
A força livre do ar.
Destrói mais essa prisão de pedra.
Faze-te recepo.
Âmbito.
Espaço.
Amplia-te.
Sê o grande sopro
Que circula...

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 05 – ESE CUERPO TUYO

Ese cuerpo tuyo es un fardo.
Es una gran montaña aplastándote.
No dejándote sentir el viento libre
Del Infinito.
Quiebra tu cuerpo en cavernas
Para dentro de ti rugir
La fuerza libre del aire.
Destruye esa prisión de piedra.
Hazte receptor.
Ámbito.
Espacio.
Amplíate.
Sé el gran soplo
Que circula...

Cecilia Meireles

(Versión de Pedro Casas Serra)

sábado, 16 de julio de 2016

“CÂNTICO 04 - ADORMECE O TEU CORPO” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 04 - ADORMECE O TEU CORPO

Adormece o teu corpo com a música da vida
Encanta-te.
Esquece-te.
Tem por volúpia a dispersão.
Não queiras ser tu.
Quere ser a alma infinita de tudo.
Troca o teu curto sonho humano
Pelo sonho imortal.
O único.
Vence a miséria de ter medo.
Troca-te pelo Desconhecido.
Não vês, então, que ele é maior?
Não vês que ele não tem fim?
Não vês que ele és tu mesmo?
Tu que andas esquecido de ti?

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 04 - ADORMECE TU CUERPO

Adormece tu cuerpo con la música de la vida.
Encántate.
Olvídate.
Ten por voluptuosidad la dispersión.
No quieras ser tú.
Quiere ser el alma infinita de todo.
Trueca tu corto sueño humano
Por el sueño inmortal.
El único.
Vence la miseria de tener miedo.
Cámbiate por lo Desconocido.
¿No ves que es mayor?
¿No ves que no tiene fin?
¿No ves que eres tú mismo?
¿Tú que andas olvidado de ti?

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

viernes, 15 de julio de 2016

“CÂNTICO 03 - NÃO DIGAS ONDE ACABA O DIA” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 03 - NÃO DIGAS ONDE ACABA O DIA

Não digas onde acaba o dia.
Onde começa a noite.
Não fales palavras vãs.
As palavras do mundo.
Não digas onde começa a terra.
Onde termina o Céu.
Não digas até onde és tu.
Não digas desde onde é Deus.
Não fales palavras vãs.
Desfaze-te da vaidade triste de falar.
Pensa, completamente silencioso.
Até a glória de ficar silencioso.
Sem pensar.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 03 - NO DIGAS DONDE ACABA EL DIA

No digas donde acaba el día.
Donde comienza la noche.
No pronuncies palabras vanas.
Las palabras del mundo.
No digas donde comienza la tierra.
Donde termina el Cielo.
No digas hasta donde eres tú.
No digas desde donde es Dios.
No pronuncies palabras vanas.
Deshazte de la triste vanidad de hablar.
Piensa, completamente silencioso.
Hasta la gloria de quedar silencioso.
Sin pensar.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

jueves, 14 de julio de 2016

“CÂNTICO 02 - NÃO SEJAS O DE HOJE” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 02 - NÃO SEJAS O DE HOJE

Não sejas o de hoje.
Não suspires por ontens...
Não queiras ser o de amanhã.
Faze-te sem limites no tempo.
Vê a tua vida em todas as origens.
Em todas as existências.
Em todas as mortes.
E sabe que serás assim para sempre.
Não queiras marcar a tua passagem.
Ela prossegue:
É a passagem que se continua.
É a tua eternidade...
É a eternidade.
És tu.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 02 – NO SEAS LO DE HOY

No seas lo de hoy.
No suspires por ayeres...
No quieras ser lo de mañana.
Hazte sin límites en el tiempo.
Ve tu vida en todos los orígenes.
En todas las existencias.
En todas las muertes.
Y sabe que serás así para siempre.
No quieras marcar tu pasar.
El prosigue:
Es el pasar el que se continúa.
Es tu eternidad...
Es la eternidad.
Eres tú.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

miércoles, 13 de julio de 2016

“CÂNTICO 01 - NÃO QUEIRAS TER PÁTRIA” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO 01 - NÃO QUEIRAS TER PÁTRIA

Não queiras ter Pátria.
Não dividas a Terra.
Não dividas o Céu.
Não arranques pedaços ao mar.
Não queiras ter.
Nasce bem alto,
Que as coisas todas serão tuas.
Que alcançarás todos os horizontes.
Que o teu olhar, estando em toda a parte
Te ponha em tudo,
Como Deus.

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO 01 - NO QUIERAS TENER PATRIA

No quieras tener Patria.
No dividas la Tierra.
No dividas el Cielo.
No arranques pedazos al mar.
No quieras tener.
Crece bien alto,
Que todas las cosas serán tuyas.
Que alcanzarás todos los horizontes.
Que tu mirada, estando en todas partes
Te ponga en todo,
Como Dios.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serraq)

martes, 12 de julio de 2016

“CÂNTICO – HE FICASTE SÓ TU” de Cecilia Meireles (De Cânticos, 1982)

CÂNTICO - E FICASTE SÓ TU

Dize:
O vento do meu espírito
Soprou sobre a vida.
E tudo que era efêmero
Se desfez.
E ficaste só tu, que és eterno...

Cecilia Meireles (In Cânticos, 1982)


CÁNTICO - Y SÓLO QUEDASTE TÚ

Dice:
El viento de mi espíritu
Sopló sobre la vida.
Y todo lo que era efímero
Se deshizo.
Y sólo quedaste tú, que eres eterno...

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

lunes, 11 de julio de 2016

“POSTAL” de Cecilia Meireles (De Flor de Poemas, 1972)

POSTAL

Por cima de que jardim
duas pombinhas estão
dizendo uma para outra:
‘Amar, sim; querer-te, não?’

Por cima de que navios
duas gaivotas irão
gritando a ventos opostos:
’Sofrer, sim; queixar-me não?’

Em que lugar, em que mármores,
que aves tranqüilas irão
dizer à noite vazia:
‘Morrer, sim; esquecer, não?’

E aquela rosa de cinza
que foi nosso coração
como estará longe, e livre
de toda e qualquer canção!

Cecilia Meireles (in Flor de Poemas, 1972)


POSTAL

¿Encima de qué jardín
dos palomitas están
diciéndose una a otra:
‘Amar, sí; quererte, no?’

¿Encima de qué navíos
dos gaviotas irán
gritando a vientos opuestos:
’Sufrir, sí; quejarme no?’

¿En qué lugar, en qué mármoles,
qué aves tranquilas irán
a decir a la noche vacía:
‘Morir, sí; olvidar, no?’

¡Y aquella rosa de ceniza
que fue nuestro corazón
qué lejos estará, y libre
de toda y cualquier canción!

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

domingo, 10 de julio de 2016

“RESPIRO TEU NOME” de Cecilia Meireles (De Canções, 1956)

RESPIRO TEU NOME

Respiro teu nome.
que brisa tão pura
súbito circula
no meu coração.

Respiro teu nome.
repentinamente,
de mim se desprende
a voz da canção.

Respiro teu nome.
Que nome? Procuro...
- Ah teu nome é tudo.
E é tudo ilusão.

Respiro teu nome.
Sorte. Vida. Tempo.
Meu contentamento
é límpido e vão.

Respiro teu nome.
Mas teu nome passa.
Alto é o sonho. Rasa,
minha breve mão.

Cecilia Meireles (in Canções, 1956)


RESPIRO TU NOMBRE

Respiro tu nombre.
qué brisa tan pura
de pronto circula
por mi corazón.

Respiro tu nombre.
repentinamente,
de mí se desprende
la voz de canción.

Respiro tu nombre.
¿Qué nombre? Rebusco...
- Ah tu nombre es todo.
Y es todo ilusión.

Respiro tu nombre.
Suerte. Vida. Tiempo.
Mi contentamiento
es límpido y vano.

Respiro tu nombre.
Mas tu nombre pasa.
Alto el sueño. Rasa,
mi pequeña mano.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

sábado, 9 de julio de 2016

“QUANDO MEU ROSTO CONTEMPLO” de Cecilia Meireles (De Canções, 1956)

QUANDO MEU ROSTO CONTEMPLO

Quando meu rosto contemplo,
o espelho se despedaça:
por ver como passa o tempo
e o meu desgosto não passa.

Amargo campo da vida,
quem te semeou com dureza,
que os que não se matam de ira
morrem de pura tristeza?

Cecilia Meireles (in Canções, 1956)


CUANDO MI ROSTRO CONTEMPLO

Cuando mi rostro contemplo,
el espejo se desgaja:
por ver como pasa el tiempo
y mi disgusto no pasa.

Amargo campo de vida,
¿quién te sembró con dureza,
que quienes no mueren de ira
mueren de pura tristeza?

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

viernes, 8 de julio de 2016

“DE LONGE TE HEI DE AMAR” de Cecilia Meireles (De Canções, 1956)

DE LONGE TE HEI DE AMAR

De longe te hei de amar,
- da tranqüila distância
em que o amor é saudade
e o desejo, constância.

Do divino lugar
onde o bem da existência
é ser eternidade
é parecer ausência.

Quem precisa explicar
o momento e a fragrância
da Rosa, que persuade
sem nenhuma arrogância?

E, no fundo do mar,
a estrela, sem violência,
cumpre a sua verdade,
alheia à transparência.

Cecilia Meireles (In Canções, 1956)


DE LEJOS TE HE DE AMAR

De lejos te he de amar,
- desde la tranquila distancia
en que el amor es añoranza
y el deseo, constancia.

Desde el divino lugar
donde el bien de la existencia
es ser eternidad
es parecer ausencia.

¿Quién necesita explicar
el momento y la fragancia
de la Rosa, que persuade
sin ninguna arrogancia?

Y, en el fondo del mar,
la estrella, sin violencia,
cumple su verdad,
ajena a la transparencia.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

jueves, 7 de julio de 2016

“SEM CORPO NENHUM” de Cecilia Meireles (De Retrato Natural, 1949)

SEM CORPO NENHUM

Sem corpo nenhum,
como te hei de amar?
— Minha alma, minha alma,
tu mesma escolheste
esse doce mal!

Sem palavra alguma,
como o hei de saber?
— Minha alma, minha alma,
tu mesma desejas
o que não se vê!

Nenhuma esperança
me dás, nem te dou:
— Minha alma, minha alma,
eis toda a conquista
do mais longo amor!

Cecilia Meireles (In Poemas, 1951)


SIN CUERPO NINGUNO

Sin cuerpo ninguno,
¿cómo te he de amar?
— ¡Alma mía, alma,
tú misma escogiste
ese dulce mal!

Sin palabra alguna,
¿cómo he de saber?
— ¡Alma mía, alma,
tú misma deseas
lo que no se ve!

Ninguna esperanza
me das, ni te doy:
— ¡Alma mía, alma,
he ahí la conquista
del mayor amor!

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

miércoles, 6 de julio de 2016

“RECADO AOS AMIGOS DISTANTES” de Cecilia Meireles (De Retrato Natural, 1949)

RECADO AOS AMIGOS DISTANTES

Meus companheiros amados,
não vos espero nem chamo:
porque vou para outros lados.
Mas é certo que vos amo.

Nem sempre os que estão mais perto
fazem melhor companhia.
Mesmo com sol encoberto,
todos sabem quando é dia.

Pelo vosso campo imenso,
vou cortando meus atalhos.
Por vosso amor é que penso
e me dou tantos trabalhos.

Não condeneis, por enquanto,
minha rebelde maneira.
Para libertar-me tanto,
fico vossa prisioneira.

Por mais que longe pareça,
ides na minha lembrança,
ides na minha cabeça,
valeis a minha Esperança.

Cecilia Meireles (In Poemas, 1951)


MENSAJE A LOS AMIGOS DISTANTES

Mis compañeros amados,
no os espero ni os reclamo:
porque voy para otros lados.
Pero lo cierto es que os amo.

No siempre los que están cerca
hacen mejor compañía.
Aun con el sol encubierto,
todos saben cuando es día.

Por vuestros campos inmensos,
voy cortando mis atajos.
Es por vuestro amor que pienso
y me doy tantos trabajos.

No condenéis, de momento,
mi revoltosa manera.
Para liberarme tanto,
quedo vuestra prisionera.

Por más que lejos parezca,
viajáis en mi recuerdo,
viajáis en mi cabeza,
delimitáis mi Esperanza.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

martes, 5 de julio de 2016

“EPITÁFIO” de Cecilia Meireles (De Retrato Natural, 1949)

EPITÁFIO

Ainda correm lágrimas pelos
teus grisalhos, tristes cabelos,
na terra vã desintegrados,
em pequenas flores tornados.

Todos os dias estás viva,
na soledade pensativa,
ó simples alma grave e pura,
livre de qualquer sepultura!

E não sou mais do que a menina
que a tua antiga sorte ensina.
E caminhamos de mão dada
pelas praias da madrugada.

Cecilia Meireles (In Poemas,1942-1959)


EPITAFIO

Aún corren lágrimas por tus
grises, tristes cabellos,
en tierra vana desintegrados,
en pequeñas flores tornados.

Todos los días estás viva,
en la soledad pensativa,
¡oh simple alma grave y pura,
libre de cualquier sepultura!

Y no soy más que la pequeña
que tu antigua suerte enseña.
Y caminamos, de la mano
por las playas de la madrugada.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

lunes, 4 de julio de 2016

“PÁSSARO” de Cecilia Meireles (De Retrato Natural, 1949)

PÁSSARO

Aquilo que ontem cantava
já não canta.
Morreu de uma flor na boca:
não do espinho na garganta.

Ele amava a água sem sede,
e, em verdade,
tendo asas, fitava o tempo,
livre de necessidade.

Não foi desejo ou imprudência:
não foi nada.
E o dia toca em silêncio
a desventura causada.

Se acaso isso é desventura:
ir-se a vida
sobre uma rosa tão bela,
por uma tênue ferida.

Cecilia Meireles (In Retrato Natural, 1949)


PÁJARO

Aquello que ayer cantaba
ya no canta.
Murió de flor en la boca:
no de espina en la garganta.

Amaba el agua sin sed,
y, en verdad,
teniendo alas, miraba el tiempo,
libre de necesidad.

No fue deseo o imprudencia:
no fue nada.
Y el día toca en silencio
la desventura causada.

Si acaso eso es desventura:
irse la vida
sobre una rosa tan bella,
por una tenue herida.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

domingo, 3 de julio de 2016

“PRELÚDIO” de Cecilia Meireles (De Mar Absoluto, 1945)

PRELÚDIO

Que tempo seria,
ó sangue, ó flor,
em que se amaria
de amor.

Pérolas de espuma,
de espuma e sal.
Nunca mais nenhuma
igual.

Era mar e lua:
minha voz, mar.
Mas a tua... a tua,
– luar!

Coroa divina
que a própria luz
nunca mais tão fina
produz.

Que tempo seria,
ó sangue, ó flor,
em que se amaria
de amor!

Cecilia Meireles (in Mar Absoluto, 1945)


PRELUDIO

En qué tiempo sería,
oh sangre, oh flor,
en que se amaría
de amor.

Perlas de espuma,
de espuma y sal.
Nunca alguna
igual.

Era mar y luna:
mi voz, mar.
Mas la tuya... la tuya,
– ¡luar!

Corona divina
que la propia luz
ninguna tan fina
causa.

¡En qué tiempo sería,
oh sangre, oh flor,
en que se amaría
de amor!

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

sábado, 2 de julio de 2016

“MULHER AO ESPELHO” de Cecilia Meireles (De Mar Absoluto, 1945)

MULHER AO ESPELHO

Hoje, que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.

Já fui loura, já fui morena,
Já fui Margarida e Beatriz,
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.

Que mal faz, esta cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se tudo é tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?

Por fora, serei como queira,
a moda, que vai me matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.

Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus,
e morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.

Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.

Cecilia Meireles (in Mar Absoluto, 1945)


MUJER AL ESPEJO

Hoy, que sea ésta o aquélla,
poco me importa.
Quiero sólo parecer bella,
pues, sea cuál sea, estoy muerta.

Ya fui rubia, ya fui morena,
Ya fui Margarita y Beatriz,
Ya fui Maria y Magdalena.
Mas no pude ser cómo quise.

¿Qué más da, este color fingido
de mi cabello, y de mi rostro,
si todo es tinta: el mundo, la vida,
la alegría, el disgusto?

Por fuera, seré como quiera
la moda, que me va matando.
Que se me lleven piel y calavera
a la nada, no me importa cuando.

Mas quien vio, tan lacerados,
sus ojos, brazos y sueños,
y murió por sus pecados,
hablará con Dios.

Hablará, cubierta de luces,
del alto peinado al azorado tobillo.
Porque unos expiran sobre cruces,
otros, buscándose en el espejo.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)

viernes, 1 de julio de 2016

“MAR ABSOLUTO” de Cecilia Meireles (De Mar Absoluto, 1945)

MAR ABSOLUTO

Foi desde sempre o mar,
E multidões passadas me empurravam
como o barco esquecido.

Agora recordo que falavam
da revolta dos ventos,
de linhos, de cordas, de ferros,
de sereias dadas à costa.

E o rosto de meus avós estava caído
pelos mares do Oriente, com seus corais e pérolas,
e pelos mares do Norte, duros de gelo.

Então, é comigo que falam,
sou eu que devo ir.
Porque não há ninguém,
tão decidido a amar e a obedecer a seus mortos.

E tenho de procurar meus tios remotos afogados.
Tenho de levar-lhes redes de rezas,
campos convertidos em velas,
barcas sobrenaturais
com peixes mensageiros
e cantos náuticos.

E fico tonta.
acordada de repente nas praias tumultuosas.
E apressam-me, e não me deixam sequer mirar a rosa-dos-ventos.
"Para adiante! Pelo mar largo!
Livrando o corpo da lição da areia!
Ao mar! - Disciplina humana para a empresa da vida!"
Meu sangue entende-se com essas vozes poderosas.
A solidez da terra, monótona,
parece-mos fraca ilusão.
Queremos a ilusão grande do mar,
multiplicada em suas malhas de perigo.

Queremos a sua solidão robusta,
uma solidão para todos os lados,
uma ausência humana que se opõe ao mesquinho formigar do mundo,
e faz o tempo inteiriço, livre das lutas de cada dia.

O alento heróico do mar tem seu pólo secreto,
que os homens sentem, seduzidos e medrosos.

O mar é só mar, desprovido de apegos,
matando-se e recuperando-se,
correndo como um touro azul por sua própria sombra,
e arremetendo com bravura contra ninguém,
e sendo depois a pura sombra de si mesmo,
por si mesmo vencido. É o seu grande exercício.

Não precisa do destino fixo da terra,
ele que, ao mesmo tempo,
é o dançarino e a sua dança.

Tem um reino de metamorfose, para experiência:
seu corpo é o seu próprio jogo,
e sua eternidade lúdica
não apenas gratuita: mas perfeita.

Baralha seus altos contrastes:
cavalo, épico, anêmona suave,
entrega-se todos, despreza ritmo
jardins, estrelas, caudas, antenas, olhos, mas é desfolhado,
cego, nu, dono apenas de si,
da sua terminante grandeza despojada.

Não se esquece que é água, ao desdobrar suas visões:
água de todas as possibilidades,
mas sem fraqueza nenhuma.

E assim como água fala-me.
Atira-me búzios, como lembranças de sua voz,
e estrelas eriçadas, como convite ao meu destino.

Não me chama para que siga por cima dele,
nem por dentro de si:
mas para que me converta nele mesmo. É o seu máximo dom.
Não me quer arrastar como meus tios outrora,
nem lentamente conduzida.
como meus avós, de serenos olhos certeiros.

Aceita-me apenas convertida em sua natureza:
plástica, fluida, disponível,
igual a ele, em constante solilóquio,
sem exigências de princípio e fim,
desprendida de terra e céu.

E eu, que viera cautelosa,
por procurar gente passada,
suspeito que me enganei,
que há outras ordens, que não foram ouvidas;
que uma outra boca falava: não somente a de antigos mortos,
e o mar a que me mandam não é apenas este mar.

Não é apenas este mar que reboa nas minhas vidraças,
mas outro, que se parece com ele
como se parecem os vultos dos sonhos dormidos.
E entre água e estrela estudo a solidão.

E recordo minha herança de cordas e âncoras,
e encontro tudo sobre-humano.
E este mar visível levanta para mim
uma face espantosa.

E retrai-se, ao dizer-me o que preciso.
E é logo uma pequena concha fervilhante,
nódoa líquida e instável,
célula azul sumindo-se
no reino de um outro mar:
ah! do Mar Absoluto.

Cecilia Meireles (In Mar Absoluto, 1945)


MAR ABSOLUTO

Desde siempre existió el mar,
Y pretéritas multitudes me empujaban
como a un barco olvidado.

Ahora recuerdo que hablaban
de la revuelta de los vientos,
de velas, de cuerdas, de hierros,
de sirenas varadas en la costa.

Y el rostro de mis abuelos viajaba
por los mares de Oriente, con sus corales y perlas,
y por los mares del Norte, duros de hielo.

De esta forma, es a mí a quien hablan,
soy yo quien debo ir.
Porque no hay nadie,
tan decidido a amar y a obedecer a sus muertos.

Y tengo que buscar a mis remotos tíos ahogados.
Tengo que llevarles redes de rezos,
campos convertidos en velas,
barcas sobrenaturales
con peces mensajeros
y cantos náuticos.

Y quedo absorta,
de repente despierta en playas tumultuosas.
Y me apuran, y no me dejan siquiera mirar la rosa de los vientos.
"¡Adelante! ¡Por el ancho mar!
¡Liberando el cuerpo del aprendizaje de la arena!
¡Al mar! - ¡Humana disciplina para la empresa de la vida!"
Mi sangre se entiende con esas voces poderosas.
La solidez de la tierra, monótona,
nos parece débil ilusión.
Queremos la gran ilusión del mar,
multiplicada en sus redes de peligro.

Queremos su soledad robusta,
una soledad por doquier,
una ausencia humana que se opone al mezquino hormiguear del mundo,
y hace sólido al tiempo, libre de las luchas de cada día.

El heróico aliento del mar tiene su polo secreto,
que los hombres sienten, seducidos y miedosos.

El mar es sólo mar, desprovisto de apegos,
muriéndose y reviviendo,
corriendo como un toro azul por su propia sombra,
y arremetiendo con bravura contra nadie,
y después siendo la pura sombra de sí mismo,
por sí mismo vencido. Es su gran ejercicio.

No precisa del destino seguro de la tierra,
él que, a la vez,
es el bailarín y su baile.

Tiene un reino de metamorfosis, para la experiencia:
su cuerpo es su propio juego,
y su eternidad lúdica
no sólo gratuita: sino perfecta.

Baraja sus grandes contrastes:
caballo, épico, anémona suave,
se entrega a todos, desprecia ritmo
jardines, estrellas, colas, antenas, ojos, pero es deshojado,
ciego, desnudo, dueño sólo de sí,
de su inequívoca grandeza despojada.

No se olvida que es agua, al desplegar sus visiones:
agua de todas las posibilidades,
pero sin flaqueza ninguna.

Y como agua me habla.
Me arroja caracolas, como recuerdos de su voz,
y estrellas erizadas, como invitación a mi destino.

No me llama para que vaya sobre él,
ni por dentro de él:
sino para que me convierta en él mismo. Es su máximo don.
No quiere arrastrarme como otrora a mis tíos,
ni lentamente conducirme
como a mis abuelos, de serenos ojos certeros.

Sólo me acepta convertida en su naturaleza:
plástica, fluida, disponible,
igual a él, en constante solilóquio,
sin exigencias de principio y fin,
desprendida de tierra y cielo.

Y yo, que llegué cautelosa,
por buscar gente remota,
sospecho que me engañé,
que hay otras órdenes, que no fueron oídas;
que otra boca hablaba: no solamente la de antiguos muertos,
y el mar al que me mandan no es sólo este mar.

No es sólo este mar el que retumba en mis vidrieras,
sino otro, que se parece a él
como se parecen las imágenes de los sueños dormidos.
Y entre agua y estrella estudio la soledad.

Y recuerdo mi herencia de cuerdas y anclas,
y encuentro todo sobrehumano.
Y este mar visible levanta para mí
una faz espantosa.

Y retráese, al decirme lo que preciso.
Y es después una pequeña concha burbujeante,
mancha líquida e inestable,
célula azul sumiéndose
en el reino de otro mar:
¡ah! del Mar Absoluto.

Cecilia Meireles
(Versión de Pedro Casas Serra)