O BARQUEIRO
Nasce o barqueiro
quando o barco afunda.
Nasce e não morre nunca mais. A viagem
quem a faz é o barqueiro, a vera viagem,
cumprida por si mesma, e tão comprida
que o tempo se dissolve, deslembrado.
O barqueiro é quem vai: livre das águas,
a salvo dos encalhes, das vigílias,
isento de bombordos. É quem vai
lá para além dos mares, onde um rio
perenemente flui, feito de estrelas.
Barqueiros há, porém, que ficarão
retidos nos porões, no antro das torres,
e as torres e os porões se gastarão
e os barqueiros sozinhos ficarão,
eternos desnascidos ficarão,
mascando medos, gulas e tremores
até que um dia as águas arderão.
O barqueiro é o que nasce. Que nascer
jamais será chegar, pois todos chegam,
barqueiros como barcos: simultâneos.
Nascer é desvelar-se. É ter-se e dar-se.
É ser-se dono e servo, inteiramente.
Nascer é renascer, por vias úmidas.
Nasce e não morre nunca mais. A viagem
quem a faz é o barqueiro, a vera viagem,
cumprida por si mesma, e tão comprida
que o tempo se dissolve, deslembrado.
O barqueiro é quem vai: livre das águas,
a salvo dos encalhes, das vigílias,
isento de bombordos. É quem vai
lá para além dos mares, onde um rio
perenemente flui, feito de estrelas.
Barqueiros há, porém, que ficarão
retidos nos porões, no antro das torres,
e as torres e os porões se gastarão
e os barqueiros sozinhos ficarão,
eternos desnascidos ficarão,
mascando medos, gulas e tremores
até que um dia as águas arderão.
O barqueiro é o que nasce. Que nascer
jamais será chegar, pois todos chegam,
barqueiros como barcos: simultâneos.
Nascer é desvelar-se. É ter-se e dar-se.
É ser-se dono e servo, inteiramente.
Nascer é renascer, por vias úmidas.
Thiago de Mello (Tenebrosa Acqua, 1954)
El BARQUERO
Nace el barquero cuando
el barco se hunde.
Nace y no muere nunca
más. El viaje
quien lo hace es el
barquero, el verdadero viaje,
concluido por sí
mismo, y tan concluido
que el tiempo se
disuelve, abandonado.
El barquero es quien
va: libre del agua,
a salvo de varadas, de
vigilias,
librado de babores. Es
quien va
más allá de los
mares, donde un río
perennemente fluye,
hecho de estrellas.
Pero barqueros hay que
quedarán
retenidos en sótanos,
en torres,
y las torres y sótanos
caerán
y solos los barqueros
quedarán,
eternos no nacidos
quedarán,
mascando miedos, gulas
y temblores
hasta cuando las aguas
arderán.
El barquero es quien
nace. Que nacer
jamás será llegar,
pues todos llegan,
barqueros como barcos:
simultáneos.
Nacer es desvelarse. Es
tenerse y es darse.
Es serse dueño y
siervo, totalmente.
Nacer
es renacer, por vías húmedas.
Thiago de Mello
(Versión de Pedro Casas Serra)
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